sábado, 23 de maio de 2015

Resenha "Alta fidelidade"


"Se eu vivesse na Bósnia, o fato de não ter uma namorada não pareceria a coisa mais importante do mundo, mas aqui em Crouch End parece. Você precisa de todo o lastro possível para não sair flutuando por aí; você precisa de gente à sua volta, coisas acontecendo, se não a vida vira um filme onde o dinheiro acabou, e não há cenários, nem locações, nem atores coadjuvantes, só um cara sozinho para a câmera sem nada para fazer e ninguém com quem falar, e quem acreditaria nesse personagem, então? Eu tenho que colocar mais troços, mais tralha, mas detalhes aqui porque no momento eu estou correndo o risco de cair no abismo." (p. 68)

"Alta fidelidade", basicamente, narra a problemática de um rapaz em seus relacionamentos a respeito da questão da fidelidade, seja da parte dele ou da parte de suas companheiras. Rob Fleming, o protagonista, procura dissecar a justificativa de seus términos mais intensos quando se separa de sua atual namorada. As situações se tornam até mesmo cômicas e colocam seu orgulho em risco com a realidade.

O que torna essa história interessante é que, embora relate experiências românticas, estas não são idealizadas como costumamos ler em livros românticos. Ou seja, não há "almas gêmeas" perfeitas, namoros cujo(a) companheiro(a) não possui defeitos, e sim as coisa como realmente funcionam.


O livro é de leitura fácil e repleto de ironias, além de um toque de pessimismo, o que normal não só na nossa vida, mas também no momento de desilusão amorosa na qual o personagem está passando. Talvez por se tratar de um escritor e um narrador masculino, você também verá algumas declarações machistas ao longo da história (embora eu, como feminista, tenha-o perdoado devido ao contexto do livro e ao fracasso no qual o personagem vive hahah). Além disso, você também poderá ver singelas críticas a esse ideal de relacionamentos amorosos que a mídia nutre em vários meios de comunicação, como no excerto apresentado no começo da resenha.

Para quem gosta de música, também é um prato cheio. A história levanta canções em diversas situações. Rob trabalha em uma loja de fitas musicais, portanto, a música já é sua sobrevivência. Contudo, você percebe a relevância que a música também tem em sua vida quando, para todas as situações que ele passa, são apresentadas músicas que as definem. Admito que fiquei curiosa para descobrir muitas das músicas citadas na narrativa.

"Tenho a impressão de que se a gente coloca a música (e livros, provavelmente, e filmes e peças e qualquer coisa que faça você sentir) no centro da nossa existência, então não dá para organizar a vida amorosa, não dá para começar a pensar nela como um produto acabado. Você tem que mexer com ela, mantê-la viva e tumultuada, mexer com ela e dentro dela, até que ela desmancha e você se vê compelido a começar tudo de novo. Talvez todos nós vivamos a vida num ritmo rápido demais, aqueles de nós que absorvem coisas emocionais o dia todo, e como consequência nunca conseguimos nos sentir meramente contentes: temos que estar ou infelizes ou em êxtase, desvairadamente felizes, e estes estados são difíceis de atingir dentro de um relacionamento estável e sólido." (p. 141)

Alías, vale ressaltar que a história também apresenta o próprio crescimento pessoal do personagem. Ao longo da narrativa, você verá vários vitimismos e intolerâncias que precisam ser desfeitos para que Rob realmente entenda o seu problema. Claro, não se trata de um romance de formação, assim como o protagonista já é um adulto com mais de 30 anos, então consideremos que a mudança de ideias e percepções não acontecerá na mesma velocidade da de um leitor mais jovem (deixo claro que é porque muitas vezes me parecem que, quanto mais velha a pessoa fica, mais suas crenças de vida estão mais enraizadas, então a flexibilidade de amadurecimento é menor). Mas, de certo modo, é possível perceber o quanto Rob procura motivações para a compreensão da realidade.

Para finalizar, talvez esse livro não agrade quem goste de histórias românticas e bem açucaradas, mas acredito que seja bom se entregar para uma narrativa mais realista, mais próxima do que muitas pessoas passam de verdade, para adquirir um crescimento pessoal e crítico que muitas outras histórias não oferecem. Fica aqui a dica :)

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